um jantar deliciosamente campestre, nos arredores de Lisboa, durante o qual o meu poeta se mostrou comedido e discreto até ao ponto de me irritar os nervos.
Mas o frio e a chuva apertaram, com o ano novo, e eu, viuva, livre, independente, entendi que podia, sem grandes inconvenientes, receber em minha casa o Miguel, umas vezes por outras e com tôdo o recato. Vieram, então, as tardes passadas na minha salinha, tomando chá e saboreando cigarrilhas egipcias. Mas, com a continuação, enfastiei-me dêstes tête-à-tête. Principiei a achar monótono o ar de continua adoração do Miguel e, uma tarde, surpreendi-me a bocejar durante a sua vizita. Pensei em que sempre tinha ouvido dizer que os beijos podem, pela sua variedade, formar uma verdadeira e melodiosa escala — deve ser a de lá menor — e que, afinal, os dêle se pareciam todos uns com os outros. Senti-me desgostosa e essa impressão, atenuada por quasi trez meses de afastamento, no ultimo estio, voltou a acentuar-se quando, em fins de Setembro, recomeçámos a frequentar-nos. Deliberei, pois, pôr termo a este estado de coisas e assentei comigo em que era inevitável um rompimento.
Dezembro começou; pouco depois, meus tios foram chamados ao Algarve, por causa da herança dos Saraivas, e eu tive a fantasia de escolher a noite de
— 191 —