— Minha mulher é um anjo, mas já não me interessa nem mesmo como enfermeira. Conheço de cór todas as suas bondades e todas as suas puerilidades. A si, posso dizê-lo. Eu comparo o espirito dela, liso e transparente, ao vidro de uma janela: a gente ólha distraidamente para a rua através desse vidro, sem sequer pensar nêle, nem considerar a sua utilidade.
— Mas olhe que se o vidro quebra e entra a nortada...
— Não me parece provável.
— Isso depende da temperatura que haja em casa. Nunca fiando, meu amigo.
— Eu confio absolutamente. Em minha mulher, tudo é calmo, simples, natural. Não há, no seu modo de sêr, nada que me estimule, que me perturbe, que me dê essa efervescencia cerebral que me é indispensável na vida, no amor... Muitas vezes me tenho lembrado de si, Camila, dos seus caprichos, dos seus silencios misteriosos, dos seus relampagos de nervosa alegria, das suas ironias aceradas, dos seus assomos de paixão...
— Prodigiosa memória!
— Não ria assim, Camila. Veja que não consegui abafar por mais tempo o desejo de tornar a vê-la. Bem sei que fui ingrato para consigo, mas...
— Acho bem que tenha vindo vêr-me, mas supo-
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