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Página:Diana de Liz - Memorias duma mulher da epoca.pdf/210

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Diana de Liz: Memorias


 

— Já?

— Já, sim. Passei uma tarde fastidiosa. O mundo exterior fatiga-me cada vez mais... Paz, só junto de ti, na nossa casa. Vais vêr que, de hoje em diante, voltarei sempre cêdo.

Cá fóra chuviscava. Filipe acercou-se da janela e atentou nos vidros, embaciados por dentro, salpicados por fóra. Volveu depois os olhos para sua mulher, cuja cabeça juvenil, inclinada sobre o bordado, lembrava uma flôr pendida. Começou, involuntariamente, a vê-la sob um aspecto novo, vagamente inquietante. Aquele cerebrosinho calmo, vulgar, que êle supunha conhecer tão bem, seria, afinal, susceptivel de raciocinios complicados? Recordou as palavras de Camila. E, pela primeira vez, o acicatou o receio de, num momento infeliz, surpreender embaciada, salpicada como os vidros da janela, aquela alma simples e transparente, através da qual ele costumava olhar, entediadamente, para o mundo...

— Está lá?

— Sou eu, querido! Camila... Como vais? Tenho, tenho muitas saudades. Vens, dentro de cinco minutos?... Sim, podes vir. Esteve aqui até há

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