sente... tem necessidade de uma afeição criada por ele só, e que não venha do sangue. Há uma porção d'alma que pertence à família e vive nela, como as raízes desta planta, no seio da terra que a produz... Mas a outra porção, essa é nossa unicamente e também precisa de sentir e viver! Não é assim?
— Deus quis que fosse assim, para que a humanidade existisse.
— Deus quis... Mas por que me pôs ele n'alma esta dúvida cruel?... Tenho dezessete anos, e já me sinto órfã das minhas esperanças!
— A senhora, D. Emília? Que lhe falta? Espírito, formosura e riqueza, tudo que o mundo admira...
— Eu quisera não ser admirada, mas...
Ela hesitou e reprimiu a palavra que ia pronunciar.
— Não falemos nisso. Já lhe disse que não acredito em paixões. Durante o ano que passou, esperdicei por aí, por essas reuniões, meus sonhos, minhas alegrias, minha alma! Sabe o que eu trazia? A desilusão!... Quando entrava em mim não achava senão uma lembrança doce e pura... Era a minha boa gratidão, o reconhecimento que eu lhe votava... E não sabia tudo ainda... Não tinha ainda aqui como agora suas lágrimas!...
— Obrigado, D. Emília!
— Oh! Não me agradeça!... Escute-me! Essa gratidão, esse sentimento bom e puro, era uma coisa minha, oculta e desconhecida, que eu dedicava no silêncio de minha alma à sua memória...