um aleijão e não gigante, um aborto em vez de heroe e, em vez de sobr'exceder a todos com a fronte, andaria sumido entre elles, visitado escassamente pelo sol e pela luz. Elle, que não soubera procurar para si o seu caminho, como poderia elle allumiar o dos outros? Elle, humilde, como ensinaria a altivez e a dignidade? Respeitador de conveniencias estereis, como daria o exemplo das revoltas fecundas? Sem alma, como a insuflaria no peito dos tristes e humilhados? Sem vontade, como resistiria ás tyrannias da opinião omnipotente, ao capricho dos grandes, ás ambições, ás tentações?
As grandes, as bellas, as boas cousas só se fazem quando se é bom, bello e grande. Mas a condição da grandeza, da belleza, da bondade, a primeira e indispensavel condição, não é o talento, nem a sciencia, nem a experiencia: é a elevação moral, a virtude da altivez interior, a independencia da alma e a dignidade do pensamento e do caracter. Nem aos mestres, aos que a maioria boçal aponta como illustres, nem á opinião, á critica sem sciencia nem consciencia das turbas, do maior numero, deve pedir conselhos e approvação, mas só ao seu entendimento, á sua meditação, ás suas crenças. Nesta eschola do trabalho, da dignidade, das altas convicções, se formam os homens em cujos peitos a humanidade encontra sempre um vasto lago onde farte a sêde de verdade, de consolações, de ensinos para a intelligencia e confortos para o coração.
No peito dos outros, dos que andam de capella em capella na lida afanosa de incensar cada dia todos os idolos, dos que fazem da gloria uma bastilha para aventureiros levarem de assalto, e não pulpito aonde se suba com respeito e amor, no peito d'esses não habita mais do que ambição, vaidade, endurecimento e miseria. Esses lisongeiam os grandes; e os grandes dão-lhes a mão para que subam, e desprezam-nos depois. Lisongeiam as maiorias; e as maiorias inconstantes lançam-lhes no regaço um pouco de ouro e algum applauso de momento, e depois passam e esquecem. Afagam todas as vaidades; e têm em cada vicio humano um capital, cujo juro dissipam em quanto vivos, porque essa moeda corrompida para mais ninguem serve. Emfim, nos quinze ou vinte annos em que dão que