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falar ás gazetas, aos botequins, aos gremios, a todos os vadios, a todos os futeis, folgam, vivem alegres e esquecidos de tudo quanto não seja a satisfação do que ha no homem de mais pequeno—a vaidade e o interesse.

Para os outros a obscuridade, e a miseria muita vez—mas a estima dos melhores entre os homens pelo espirito, e, o que excede tudo, a posse d'uma consciencia superior a quanto não seja a verdade, a justiça e a formosura. As idêas serenas brilham-lhes na escuridão do isolamento e alumiam-lhes com uma luz doce mas immensa toda a sua obscuridade. Dão-se a desbaratar o mal dos outros homens, como muitos se dão a augmentar o seu bem proprio. Vivem na região das bençãos, escutando as palavras da bôcca invisivel, e com os echos d'essa voz celeste compõem os hymnos de esperança e de amor para a humanidade. Morrem; mas morrem nobres e puros. Tudo isto porque foram independentes. Não pertenceram a corrilhos; não elogiaram ninguem para que os elogiassem a elles; não incensaram os fetiches dos ridiculos pagodes litterarios. Foram honrados. Foram simples.

A estes taes chamo eu poetas. Porque nos ensinam o bem. Porque são originaes e dizem sempre alguma cousa nova á nossa curiosidade de saber. Porque dão com a elevação das vidas confirmação á sublimidade dos escriptos. Porque são tão poeticos como os seus poemas. Porque vão adiante abrindo á luz e ao amor novos horisontes. Porque não conhecem ambições nem orgulhos. Porque têm a cabeça do genio e o coração da innocencia. É por isso tudo que lhes chamo poetas.

Os outros adoram a palavra, que illude o vulgo, e desprezam a idêa, que custa muito e nada luz. São apostolos do diccionario, e têm por evangelho um tractado de metrificação. Fazem da poesia o instrumento de suas vaidades. Pregam o bem por uso e convenção litteraria, porque se presta á declamação poetica, mas practicam o egoismo por indole e por vontade. Fazem-nos descrer da grandeza humana, porque são uns sophismas que nos mostram a pequenez e a má fé aonde as apparencias são todas de nobreza. Preferem imitar a inventar; e a imitar preferem ainda traduzir. Repetem o que está dicto ha mil annos, e