quanto antes um assento; alêm de que era esse paiz governado pelo genro de Priamo, Polymnestor, em quem se esperava encontrar acolhimento e soccorro; mas, advertido por Polydoro da perfidia e crueza de Polymnestor, depois de já têr começado a edificar, foi constrangido a largar a terra, onde com effeito se tinha querido fixar. Respondida á primeira, passemos á segunda. Ainda na incerteza (pois não tinha occorrido o aviso dos penates, que o decidiu) em sua viagem errante chega a Delos; e he natural que o religioso capitão ahi consultasse o oraculo por via do rei e sacerdote Anio, amigo velho de Anchises. Un oracle toujours se plaît à se cacher, diz Racine: aquelle foi ambiguo; e, tendo-se de buscar a Italia ou Creta, Anchises se declarou pela última donde era Teucro, mais antigo do que o genro Dardano, vindo da Italia. Accrescia que, sendo Creta mais proxima da Thracia, em caso de dúvida pedia a prudencia que fôssem primeiro a Creta, não havendo tanto que desandar, quanto haveria se, demandando primeiro a Italia, se vissem na precisão de voltar ao paiz de Teucro. Respondo com isto á segunda pergunta de Senadon, e ainda a uma terceira, pois tambem quer saber porque Enéas se demorou a edificar em Creta.
136-141. — 145-152. — Pretendendo os Troianos ficar em Creta pela interpretação de Anchises, imagina o poeta uma peste que dalli os expulse. Delille, com prudente reserva, insinua que a descripção devera ser mais longa; e Mr. Tissot, que toma e explana o pensamento do poeta francez, decide e corta a questão: «Virgilio, tam fecundo, rico, variado nas scenas diversas da ruína d'Ilion, he apenas um frio narrador no livro terceiro. Crer-se-ia, por exemplo, que um poeta se contente de esboçar em seis versos o quadro de um acontecimento qual o da peste que expulsa Enéas da patria de Idomeneu?» Mais accrescenta, e com Delille quer que a peste ataque a Iulo, que o pae trema pelos dias do filho; quer emfim uma daquellas descripções que, podendo ser bellas em certas conjunturas, aqui só prestariam para retardar a narração. Enéas, que rememora as suas aventuras á mesa durante o sarao, depois de têr commovido o auditorio com a ruína de Troia, trata de o intretêr com o mais essencial; a grandes traços descreve a sua viagem, e basta-lhe ás vezes um epitheto para caracterizar um facto ou uma terra: assim a fome de ouro he sacra, porque nem ao sagrado perdoa; a Thracia he mavorcia, por ser o berço do deus da guerra; Donysa he a verde, Paros he a nivea, pela côr dos seus marmores. Seu fim não era pintar uma peste, era motivar o abandono dos seus estabelecimentos[1] em Creta. Em uma longa pintura corria o poeta o risco de se repetir, pois que no terceiro das Georgicas trata já de uma peste, sôbre ser fresca a lembrança da da Attica descripta pela mão habil de Lucrecio: a longura pois me parece que não fôra a proposito, e podera excitar a idéa de um
- ↑ No original, estabelecimentes.