Saltar para o conteúdo

Página:Eneida Brazileira.djvu/132

Wikisource, a biblioteca livre

Carpe-se, afeia o rosto, os peitos fere,
Rompe o tropel, á moribunda exclama:
«Irmã, tu me illudias? Que! foi isto
Que aras, tochas, fogueiras me aprestavam?
735Qual mais doe? o abandono, o desprezares
Por socia a irmã? Teus fados repartisses;
Uma hora, um ferro, uma ancia nos tragasse.
Armei-te a pyra eu mesma, e os deuses patrios
Invoquei, para assim, cruel, jazeres
740Na minha ausencia? A mim e a ti mataste,
E o povo e os padres e a cidade tua.
Dai-me agua, eu lave o golpe; e nos seus labios,
Se alento algum vaguêa, os meus o colham.»
Não mais, e os degraus salva; ao collo aperta,
745Beija a irmã semiviva; entre ais enxuga
Na touca o tetro sangue. Os olhos graves
Quiz ella alçar, desmaia: a chaga dentro
Range a golfar. Tres vezes, arrimada
Ao cotovello foi-se erguer, tres vezes
750Rolou no tóro; e, baça a vista errante,
A luz no céo procura, e achando-a geme.
A omnipotente Juno da agonia
E angústia longa então commiserada,
Do Olympo Iris despacha, que a luctante
755Alma desate dos liados membros:
Pois nem de merecida ou fatal morte,
Mas subito immatura ah! perecia
De ira accesa; tirado a flava coma
Não lhe tinha Prosérpina, e a cabeça
760Á Estyge condemnado. Em croceas pennas,
Cambiando côres mil do Sol opposto,
Roscida a nuncia vem parar sôbre ella:
«O tributo a Plutão mandada levo;
Do corpo eu t’o desligo.» Dice, e o corta:
765Foi-se o calor e evaporou-se a vida.