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As vegetalidades subalternas
Que os serenos nocturnos orvalhavam,
Pela alta frieza intrinseca, lembravam
Toalhas molhadas sobre as minhas pernas.

E no estrume fresquissimo da gleba
Formigavam, com a simplice sarcóde,
O vibrião, o ancylóstomo, o colpóde
E outros irmãos legitimos da amœba!

E todas essas fórmas que Deus lança
No Cosmos, me pediam, com o ar horrivel,
Um pedaço de lingua disponivel
Para a philogenetica vingança!

A cidade exhalava um pôdre báfio:
Os annuncios das casas de commercio,
Mais tristes que as elégias de Propércio,
Pareciam talvez meu epitaphio.

O motor teleológico da Vida
Parára! Agora, em diástoles de guerra,
Vinha do coração quente da terra
Um rumor de materia dissolvida.

A chimica feroz do cemiterio
Transformava porções de atomos juntos
No oleo malsão que escorre dos defuntos,
Com a abundancia de um geyser deletério.

Dedos denunciadores escreviam
Na lugubre extensão da rua preta
Todo o destino negro do planeta,
Onde minhas moleculas soffriam.