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Mas, para além, entre oscillantes chammas,
Acordavam os bairros da luxuria.
As prostitutas, doentes de hematuria,
Se extenuavam nas camas.

Uma, ignobil, derreada de cansaço,
Quasi que escangalhada pelo vicio,
Cheirava com prazer no sacrificio
A lepra má que lhe roia o braço!

E ensanguentava os dedos da mão nivea
Com o sentimento gasto e a emoção pobre,
Nessa alegria barbara que cobre
Os saracoteamentos da lascivia.

De certo, a perversão de que era prêza
O sensorium daquella prostituta
Vinha da adaptação quasi absoluta
Á ambiencia microbiana da baixeza!

Emtanto, virgem fostes, e, quando o ereis,
Não tinheis ainda essa erupção cutanea,
Nem tinheis, victima ultima da insania,
Duas mammarias glándulas estereis!

Ah! Certamente, não havia ainda
Rompido, com violencia, no horizonte,
O sol malvado que seccou a fonte
De vossa castidade agora finda!

Talvez tivesseis fome, e as mãos, em balde,
Estendestes ao mundo, até que, a tôa,
Fostes vender a virginal corôa
Ao primeiro bandido do arrabalde.