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“samento. — “Porque me diz tal cousa? — objectei-
“lhe, empallidecendo, dominando o sangue as palpita-
“ções. — “Que mal ha n´isso, se é minha irmã e ca-
“sada? — retorquiu elle, calmo.”

“Serão todos os irmãos assim amaveis como
“Jorge? Hoje, á tarde, pelo espelho vi-o mergulhar a
“bôca em umas violetas que haviam estado em minha
“cintura: “Snr. Jorge, as minhas flôres? — inquiri-
“lhe assim mesmo de costas viradas. “Como são ado-
“raveis as violetas, que vão morrer no seio de uma
“irmã — exclamou elle, beijando-as.”

“Ha um certo tempo que lhe noto, no olhar, uma
“fome que grita até nas mãos — ajuntou Jorge. —
“Uma fome?” — repeti. — “Sim, uma fome, — disse
“elle emphatico, fixando-me. — “E´ a fome da morte”
“— murmurei—, dando-lhe o perfil, baixando as pal-
“pebras, metalizando-me integral, atravessada de
“sôpros obliquos. — “Sim, da morte simulada,
“d´aquella que é um veneno...— balbuciou elle, entre
“dentes,—comprehendendo perfeitamente esses males
“intimos... O amôr em uma natureza burgueza não
“se renova, não rompe monotonias, não offerece inedi-
“tismos extraordinarios... E seus nervos, Senhora
“Ladice, são como os nervos immateriaes das tormen-
“tas, dos cataclysmos,.. Devia ter sido minha” —
“exclamou elle, depois de uma pausa. — “Sua, ah! que
“horror!” — bradei surprehendida, pensando em
Theophilo. — “Minha, porque não?”—inquiriu elle
“lento, pallido, sem sangue, os bigodes e os
cabellos
“ainda mais negros.— “Porque não o amo” — res-
pondi, sem encaral-o. — “Mas deseja-me”, — ac-