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saltaram em um atalho, margeado de urzes e torgas; seus tornozelos desappareciam na areia fôfa; Ladice, de vez em quando abaixava-se para apanhar conchinhas, cascalhos, algas resequidas... A luz era intensa, offuscante, bravia, queimava as retinas, descia até ás raizes, á seiva, sugava-lhe, qual vampiro faminto, a viscosidade fecunda.

A Senhora de Assis abeirou-se do mar, queria sentir em a pelle o contacto d´essa agua vira, d´essa amorosa do céo, em cuja alma repentina e effervescente, ladainhas infernaes, trabalham. As ondas passavam-lhe pelos pés, morriam além; iam o vinham, num movimento alterno, humano, hesitante, de quem se arrepende, de quem ama, de quem se não quer separar; fragmentos de madeira, de taboas, boiavam, irmanando-se ao eapricho, á sujeição vária do fluxo e refluxo; gaivotas espalmadas subiam e desciam na ancia inconsciente de unificar, de apagar soluções, de fraternizar o ether, com o elemento salso, com a terra, com as suas vibrações de ave...

Ladice e Dinah se refugiaram sob uma coberta de colmo. A Senhora de Assis não falava; o ambiente agia-lhe em os nervos, acordava-lhe sensações extraordinarias: o ruido monotono das vagas e a ausencia de todo barulho de ser vivo, traziam-lhe ao ouvido, ás percepções, échos de vontades indomaveis e persistentes, musicas de Tritães, algazarra de Delphins enciumados... Talvez mesmo Amphitrite surgisse da agua nutante e glauca...

— Olha, Dinah, aquella gaivota mergulhando na onda emmaranhada de sol... Ella vai beher a luz --