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cos, certa ingenuidade encantadora a velar um temperamento nervoso, apaixonado, estravagante; typo accentuado da mulher moderna: intellectualidade, erudição, sensibilidade castigada, graça espontanea...

— Que livro estava a ler, quando entrei? — indagou elle, em um tom baixo, meigo.

— Poemas de Egar Poë. — E Ladice passou-lhe o volume — Conhece-o?

— Algumas — respondeu elle, folheando-o: — E´ uma musa satanica a sua. E virando o livro, leu na margem traduzidos e fortemente sublinhados os seguintes versos:

“Eu não sou como os outros são,
“eu não vejo como os outros veem,
“eu não posso tirar as minhas paixões
“de uma fonte commum...
“E tudo o que eu amo, amo sozinha...”

Ao ler o original, Theophilo, notou que a Senhora de Assis alterara o tempo dos verbos e em chegando a ultima linha, disse-o alto; em seguida, deitou-lhe um olhar rapido, pesquisador, agudo: elle vinha de ter uma revelação...

Essa phrase alheia que ella tirara de ontrem para si, essa phrase de que ella se apoderara como sendo sua, a encarnação de seu sentir — ideia que vivia n´ella como outrora vivera elle, Poë—traçava-lhe a paychologia...

Em seu cerebro, porém, uma duvida se levantara : Seria ella egoista no amôr, mesquinha, avara, cheia de imperfeições e mediocridades?... Ou o amôr n´ella