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dor da mulher é inextinguivel, que mesmo saciado, grita sempre... E´ uma nota aspera a troar eternamente em seus nervos, é uma flamma que trabalha, que cresce, que irrita... Ellas nos amam emquanto somos moços, emquanto o nosso arremêsso é uma força de volupia, emquanto a nossa vontade tem desejos universaes... — Ahi Theophilo se approximou, e parou á borda do mar. A agua palpitava mansamente como o pulso de um cachetico. — Fidelidade disse alto, com um sorriso de ironia, e continuou a pensar — é uma palavra que ellas pronunciam bellamente, sonorosamente e de tal geito que, junto com a ponta da lingua, deixam vêr a malicia, a vacuidade de significação... Fidelidade é cilada, é mentira, é falsidade em boca feminina... — Continuando a andar: — Meu Deus, odeio-lhe a mocidade, a belleza, a violencia estranha, mortal, immensa... os seus gestos, os seus cabellos revoltos, os seus olhos onde perpassam as as mobilidades de seu sentir... Ah, se ella morresse, essa mulher unica, maravilhosa... — E parou novamente. Dir-se-ia um automato, um manual de movimento, sem consciencia, sem percepções, sem os cinco sentidos. Não via que o céo, o mar, a terra eram uma só treva, uma só massa, um só cantico funebre... Não ouvia os gemidos roucos das querenas e prôas cosmopolitas, raivando contra as bordas verdes da agua faminta que os apertavam, os comprimiam, os suffocavam... Não percebia que o coração mystico da terra soffria da mesma tristeza, da mesma ancia, da mesma dôr que elle: queria perennemente que o fulgor das es-