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E os seus traços contrahiam-se de leve, e o seu corpo era uma só vertigen 'e um só extase... E Theophilo lobrigava em essa mulher gracil, divinamente branca, a immensidade das sensações, o auge, a dôr cruel, esperta, successiva de todos os sentimentos. — Olhando-a sempre, retendo-a em seus braços, mudo, bebendo a fragrancia de seu corpo empallidecido por fremitos innumeraveis, elle, tirava-lhe um a um os grampos dos cabellos que, lindos, crespos, se desfaziam, desciam á feição de serpentes que se libertam, caiam-lhe sobre os hombros em caricias, velavam-lhe o rosto, os olhos, entravam-lhe pelas dobras dos setins, pelas mãos, pelos dedos, como dadivas, como offertas, como homenagens amorosas... Através d´esse escrinio trabalhado irrequieto, de filigranas vivas, de fios ambarinos, de arabescos fantasticos, Theophilo via a boca de Ladice apparecer como uma melodia perturbante, surda, abafada; como uma flamma intensa, presa, como uma aurora incendiada pelo amôr do sol, da madrugada, do dia... E elle vazava em essa boca perfeita, transida pelo peso de duas violencias todo o seu frenesi morbido, todo o seu transporte mortal.

Dir-se-ia que a exaltação de ambos augmentava; elles não podiam falar.

E assim elles ficaram um ao lado do outro, regidos pelo mesmo rythmo, pela mesma vehemencia, grandeza e esplendor... Ambos pareciam infinitos que se enfrentam, espaços, destinos que se medem, que se encaram, que se encontram...