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diaphanos, irisados — era o ardor das abelhas, das moscas doiradas, dos escaravelhos que dormitavam... De repente, porém, essa abundancia de formas e côres, se transmutou... O seu delirio então, divisava: labios exangues abrindo-se, gargantas desfallecidas, caricias mortas, corações sem pulsação, volupia inerte, retinas incandescidas, indolencia sublime, mãos brancas, conceitos rubros... Mas essas visões, tambem já desappareciam; sobre ellas, extendia-se unindo-as, irmanando-as, reduzindo-as a uma só massa, tenue véo transparente tecido de labaredas e flammas: era o desejo de Ladice mais forte que a sua realidade que os estreitava em um abraço exterminador... mas essas imagens já se apagavam... Sobre o cimo escuro das pedras manchadas de luar, dominando o arvoredo, a ramaria, magnifico, como nas éclogas antigas, ella avistava Idas, adolescente, vestido de pelles de cabra, estrangulando um cordeirinho a Pales, para que lhe dásse sem demora, a energia tão cubiçada...

— Mas Ladice, vamos embora, a que fazes tu ahi? — inquiriu-lhe Francisco.

Ella estremeceu. A Senhora de Assis achava-se em completa inconsciencia, toda entregue ás sensações morbidas, que a sua imaginação extraordinaria lhe offerecia. Silenciosa, pausadamente, dirigiu-se para onde os outros permaneciam.

Ladice caminhava sem falar, sem alma, sem coração, sem espirito, distrahida, absorta em seu amante.

Ella se sentia a columna de fogo, o radio vivificante, o atomo espherico, mobil, o elemento puro que