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uma tormenta — accentuou este, sentindo um prazer agudo em ferir os dous corações amantes.

— Não é absolutamente um bluff, mas a evolução da amizade, do affecto, um fim — atalhou Francisco.

— Amar — disse Ladice descendo a meio as palpebras — é sermos Ione, é sermos Pantheia, é termos cruzadas sobre os olhos asas luminosas, argenteas, embutidas de soes; é experimentarmos em as sensações o abalo, o estridor, o bramido da raiva, sem alimento, das entranhas da Terra.

Por minutos todos ficaram suspensos; a voz de Ladice tinha a serenidade, o encanto de lirios que se abrem, de tardes que se escoam.

— Perdão, D. Ladice, já passamos o romantismo, o sentimentalismo de Rousseau; o amôr hoje é puramente feminino; objectou Armando, sentindo a alma torcer-se como uma sombra nutante; totalmente inconsolavel de não poder possuir essa mulher, capaz dos esplendores que acabava de proferir.

— E´ o objectivismo desesperado, então, retorquiu Theophilo. Saibas tu, Armando, que o amor é violencia exclusiva das naturezas prenhes de potencias, de forças, de energias, de transbordos de si mesmo... E´ o delirio soberbo do grande subjectivista, — rematou elle.

Toda a myrrha, todo o incenso, toda a resina perfumada do amôr de Ladice iam para o vate bem amado.

— Sim, do Poeta, do Imaginativo, mas nunca do analysta, do Pensador, que são obrigados a extirpar do senso, os estimulantes da paixão... — replicou o