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A gaze violeta lhe emprestava á imaginação sabores lividos.

Em o amôr de Ladice, Theophilo sentia a vida e a morte se misturarem... Ella lhe dava a impressão de ser um sarcophago vicejante de corymbos, de cachos, de efflorescencias em flôr, a arder de fluidez, de aromas novos, estonteantes... Parecia-lhe amar um corpo que já havia sido, que conhecera a volupia do além, a ascendencia ultima das vibrações humanas; o abandono, a caricia servil, avassallante de vermes que desconhecem o sol; pelo rosto de sua amante, seus dedos passavam irritados em busca de vestigios dirimidos dos espasmos idos de amores mortos em eras mortas... Em resposta aos seus pensamentos, elle disse alto: “Foi o ardor que te conservou inviolada e que te fez volver á vida gloriosa...”

Em Ladice permaneciam a luz e a sombra derradeiras: os seus olhares se despregavam, paravam em Theophilo, seguravam-se-lhe em a pelle como os lichens candentes do ser e da paixão; suas mãos desciam, escorregavam sobre elle dementes, agoniadas, cinzentas, como o que nunca mais será; seu beijo era continuo, voraz; tinha a mesma fome dos craneos vazios; seus cabellos se enlaçavam no pescoço do Vate bem amado, quaes braços amorosos, chamando-o: “Vem! Vem! Sejamos um só na eternidade!” A sua saudade se extendia sobre elle como uma lagrima quente, dorida, saudosa, que corre, corre...

Cedendo á vontade persistente de seus impulsos, ella lhe dizia, entregando-se: “Quebra-me, quebra-me,