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III CAPITULO

Durante seis mezes, a vida de Ladice não soffreu alteração. Com a entrada do inverno, a season surgira festiva, cheia de ancias e palpitações novas, robustecida pela calma das villegiaturas: os nervos, o cerebro, as sensações, após repousos prolongados, pausas estereis, após haverem haurido frescores de montanhas, perfumes agrestes, beatitudes de vida campestre, purezas rusticas, impacientavam-se por expandir, derramar, vazar, esgotar, essa agitação, essas energias e curiosidades renascidas, eumuladas, famintas. Os theatros, as diversões succediam-se; esperanças fugidias tornavam a despertar em corações descrentes; pupillas incendiavam-se sob pensamentos secretos; labios mudos offereciam-se a outros labios; virgens estremeciam ante a duvida de uma certeza desejada; destinos moviam-se, baixavam ás volições humanas, aos criterios individuaes. E' nessa occasião que a vida toma fórma, deixa o chaos, a indecisão, trabalha, dilata-se, reveste-se de embuste, mascara-se, para vencer, chegar ao seu fim, desdobrar-se.

Essa febre fecunda nos passa pelo sêr como o vendaval do bem e do mal: é um toxico, um encantamento, um turbilhão, a enrodilhar, a desnortear, a unir conscieneias, animos, corações.