olhos de Ladice, desviavam-se delles, não se animavam a se deter naquelles olhos, que pareciam misturar-se, unir-se, fundir-se, fazer uma só linha escura, brilhante, movediça...
Elle experimentava a sensação do suicida, quando prepara a arma fatidica; o arrepio de medo e de coragem, de destruição e de victoria; o desfallecimento, o estimulo dos velivolos, quando furam, atravessam, hombream o espaço, a tempestade, os raios...
Ladice se comprazia com observar um besouro, que voejava no redor das lampadas: olhava-o a subir, a descer, no afan tenaz de urdir linhas, arabescos, sem fórma, impalpaveis, intangiveis, como as ideias abstractas, como os dictames do porvir,
— Recorda-se de me haver dito, a ultima vez que nos vimos, senhorinha de Santo Hilario: — “Sou capaz da estima, da amizade sufficiente para a vida a dois?” — Ladice acenou ligeiramente com a cabeça. — Desejaria saber se essa phrase, que me trouxe esperanças e alegrias — continuou elle — provém da piedade ou do coração, de sua sinceridade, emfim...
— Do coração... De tudo que ha de bom em mim — respondeu ella, mansa.
— Seu coraçãozinho é muito difficil de se obter?
— Não sei...
— Com certeza, é inaccesso; ou, então, requer heroismo, lutas, para deixar-se possuir?...
— Depende, doutor; um sorriso, um olhar, uma supplica muda e elle se dá inteiro... Emquanto riquezas, estrepitos de intelligencia, abnegações o não terão, se o amor está ausente...