A Menina do Leite
Laurinha, no seu vestido novo de pintas vermelhas, chinelos de bezerro, tréc, tréc, tréc, lá ia para o mercado com uma lata de leite á cabeça — o primeiro leite da sua vaquinha mocha. Ia contente da vida, rindo-se e falando sozinha.
— Vendo o leite, dizia, e compro uma duzia de ovos. Choco os ovos e antes de um mês já tenho uma duzia de pintos. Morrem... dois, que sejam, e crescem dez — cinco frangas e cinco frangos. Vendo os frangos e crio as frangas, que crescem e viram cinco otimas botadeiras de duzentos ovos por ano cada uma. Cinco: mil ovos! Choco tudo e lá me vem quinhentos galos e mais outro tanto de galinhas. Vendo os galos. A dois cruzeiros cada um — duas vezes cinco, dez... Mil cruzeiros!... Posso então comprar doze porcas de cria e mais uma cabrita. As porcas dão-me, cada uma, seis leitões. Seis vezes doze...
Estava a menina neste ponto quando tropeçou, perdeu o equilibrio e, com lata e tudo, caíu um grande tombo no chão.
Pobre Laurinha!
Ergueu-se chorosa, com um ardor de esfoladura no joelho; e enquanto espanejava as roupas sujas de pó viu sumir-se, embebido pela terra seca, o primeiro leite da sua vaquinha mocha, e com ele os doze ovos, as cinco botadeiras, os quinhentos galos, as doze porcas de cria, a cabritinha — todos os belos sonhos da sua ardente imaginação...