O Util e o Belo
Parou um veado á beira do rio, mirando-se no espelho das aguas. E refletiu:
— Bem mal feito de corpo que sou! A cabeça é linda, com estes formosos chifres que todos os animais invejam. Mas as pernas... Muito finas, muito compridas. A natureza foi injusta comigo. Antes me désse menos pernas e mais galharada na cabeça. Que lindo diadema seria! Com que orgulho eu passearia pelos bosques ostentando um enfeite unico em toda a animalidade!...
Neste ponto interrompe-o o latido dos veadeiros, valentes cães de caça que lhe vinham na pista, como relampagos.
O veado dispara, foge á toda e embrenha-se na floresta. E enquanto corria pôde verificar quão sabia fôra a natureza dando-lhe mais pernas do que chifres, porque estes, com toda a sua formosura, só serviam para enroscar-se nos cipós e atrapalhar-lhe a fuga; e aquelas, apesar de toda a feiura, constituiam a sua unica segurança. E mudou de ideia, convencido de que antes mil vezes pernas finas, mas velocissimas, do que formosa, mas inutil galhaça.
— Se os chifres desse veado só serviam para enfeite, então a fabula está certa, disse Emilia. Mas quando um chifre é como o do Quindim, ah, então vale ainda mais do que pernas. Quindim nem sabe correr, porque não precisa fugir. Em vez de fugir na volada, como as lebres e os veadinhos, ele faz muuuu!... e espeta o inimigo.
— E que é, Emilia, que você acha melhor, perguntou Narizinho — o util ou o belo?
— Acho melhor os dois encangados, assim como uma especie de banana inconha. Util e belo ao mesmo tempo. Por que é que uma coisa util deve ser feia? Não ha razão.