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Página:Fabulas (9ª edição).pdf/48

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Ao vê-la de perto o homem estremeceu de pavor, e mais ainda quando a Magra lhe disse, batendo os ossos do queixo:

— Cha-mas-te-me; a-qui es-tou!

O velho tremia, suava... E para sair-se dos apuros só teve esta:

— Chamei-te, sim, mas para me ajudares a botar esta lenha ás costas...



— Não gosto desta fabula, disse a menina, porque aparece uma Morte muito feia. Eu não queria que pintassem a morte assim, com o alfange de cortar grama ao ombro, com a caveira em vez de cara e aquele lençol embrulhando o esqueleto...

— Você tem razão, minha filha. Essa imagem da morte é coisa da Idade Media, o tempo mais tragico e triste da Historia. A Morte não é nada disso. E’ um bem. E’ um remedio. E’ o Grande Remedio. Quando um doente está sofrendo na maior agonia, a Morte vem como o fim da dor.

— Morte de que eu gosto, disse Pedrinho, é aquela dos americanos...

Ninguem entendeu. Ele explicou.

— Lembram-se daquela fita que vimos no cinema, HORAS ROUBADAS? A Morte era Mister Ceifas, um moço muito elegante e delicado, mas de rosto impassivel. Entrou naquele jardim e com um gesto muito amavel convidou o velho entrevado a ir com ele. O velho não quis. Mister Ceifas não se aborreceu. Ficou por ali. De repente, o velho quis morrer e então Mister Ceifas aproximou-se, sempre com aquela gentileza, e extendeu-lhe a mão. E o velho ergueu-se da cadeira de rodas, leve como se fosse um moço, e lá se foi pela mão de Mister Ceifas... Que beleza! Eu gostei tanto que perdi o medo da morte. Se ela é assim, que venha buscar-me. Sairei pela mão de Mister Ceifas tal qual aquele velho — feliz, sorrindo e gosando a beleza das paisagens do outro mundo...

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