— Venho em busca de agasalho. O mau tempo não cessa e eu...
A formiga olhou-a de alto a baixo.
— E que fez durante o bom tempo que não construiu sua casa?
A pobre cigarra, toda tremendo, respondeu depois dum acesso de tosse:
— Eu cantava, bem sabe...
— Ah!... exclamou a formiga recordando-se. Era você então quem cantava nessa arvore enquanto nós labutavamos para encher as tulhas?
— Isso mesmo, era eu...
— Pois entre, amiguinha! Nunca poderemos esquecer as boas horas que sua cantoria nos proporcionou. Aquele chiado nos distraia e aliviava o trabalho. Diziamos sempre: que felicidade ter como vizinha tão gentil cantora! Entre, amiga, que aqui terá cama e mesa durante todo o mau tempo.
A cigarra entrou, sarou da tosse e voltou a ser a alegre cantora dos dias de sol.
II — A FORMIGA MA
Já houve, entretanto, uma formiga má que não soube compreender a cigarra e com dureza a repeliu de sua porta.
Foi isso na Europa, em pleno inverno, quando a neve recobria o mundo com o seu cruel manto de gelo.
A cigarra, como de costume, havia cantado sem parar o estio inteiro, e o inverno veio encontra-la desprovida de tudo, sem casa onde obrigar-se, nem folhinhas que comesse.
Desesperada, bateu á porta da formiga e implorou — emprestado, notem! — uns miseraveis restos de comida. Pagaria com juros altos aquela comida de emprestimo, logo que o tempo o permitisse.