— Farelo! exclamam desapontados. O demo o leve! Vejamos se ha coisa de mais valor no da frente.
— Ouro, ouro! gritam, arregalando os olhos. E atiram-se ao saque.
Mas o burrinho resiste. Desfere coices e dispara pelo campo afóra. Os ladrões correm-lhe atrás, cercam-no, e dão-lhe em cima, de pau e pedra. Afinal saqueiam-no.
Terminada a festa, o burrinho do ouro, mais morto que vivo e tão surrado que nem suster-se em pé podia, reclama auxilio do outro, que muito fresco da vida tosava o capim sossegadamente.
— Socorro, amigo! Venha acudir-me, que estou descadeirado...
O burrinho do farelo respondeu zombeteiramente:
— Mas poderei por acaso aproximar-me de Vossa Excelencia?
— Como não? Minha fidalguia estava toda dentro da bruáca e lá se foi nas mãos daqueles patifes. Sem as bruácas de ouro no lombo, sou uma pobre besta igual a você...
— Bem sei. Você é como certos grandes homens do mundo que só valem pelo cargo que ocupam. No fundo, simples bestas de carga, eu, tu, eles...
E ajudou-o a regressar para casa, decorando, para uso proprio, a lição que ardia no lombo do vaidoso.
— Eis aqui, meus filhos, outra fabula bem boa, disse dona Benta. O mundo está cheio de orgulhosos deste naipe...
— Que é naipe? quis saber Narizinho.
— E’ um termo usado para as cartas de jogar. Ha quatro naipes — ouro, espadas, copas e paus.