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GUESTO ANSURES

Ouvindo a segunda gargalhada, reconheceu Guesto a inutilidade de proseguir na busca, e voltou para junto da donzella.

«Vamo-nos já! — disse ella, tremendo-lhe a voz.

O joven foi soltar o cavallo, e seguiu Ermesinda, que se adiantou, descendo a encosta em sentido obliquo até entrar n’um caminho estreito.

«Maldita confiança! — disse Guesto. — Em má hora desprezei aquelle primeiro signal… Mas que novidade é esta? Não pôde ser que o conde suspeite?… que armasse espias sobre ti?… Se ao menos houvesse alcançado este com os olhos, já que o não pude com as mãos, fôra quiçá um clarão n’estas trevas.»

«Vi-o eu.»

«Que qualidade de homem representava? que trajo vestia? que…»

«Não sei dizer; apenas lhe enxerguei o vulto. Ó Guesto em noute aziaga nos separamos! O futuro que ind’agora tão rico de promessas me parecia, se me antolha negro e lugubre. O nosso segredo será divulgado; meu pae… Deus me acuda ! O conde saberá tudo ! — e a donzella parou.

No sombrio do sitio, pois tão fechada era a rua que o luar ali não achava entrada, não pôde o mancebo ver a expressão da sua companheira; mas tocando-lhe o braço, sentiu como tremia.

«Não te atormentes d’antemão — disse elle, só para socegal-a. — Se a realidade está ás vezes acima dos esforços da phantasia, esta, excitada pelo receio, costuma ir além d’aquella. Quem nos diz que o conde alcançará o que até hoje lhe havemos occultado? Póde ser que quem nos esteve escutando, estivesse ali por acaso… algum servo fazendo caminho por atalhos… Ah, já sei! Deve de ser o aloucado de Subrego; costuma andar pelas serras de noute, segundo ouvi dizer ali… Está-me até parecendo que aquellas risadas eram mesmo de um orate.»

«Antes, de judeu que désse com thesouro, ou de inimigo antevendo segura a vingança, ou de demonio colhendo a alma seduzida! Guesto — proseguiu a donzella, apertando o braço ao cavalleiro,— não sabes de alguém que, se ou-