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se tem querido enxergar a influência do grande escritor português. O feitio e isenção do seu caráter deu-lhe a forma tersa, límpida, em que juntou com discernimento e garbo o casticismo português aos naturais influxos do brasileirismo. É menos purista do que Sotero dos Reis e Odorico Mendes, que aliás também, em rigor, não o são. Põe muitas vezes os pronomes à brasileira, porque lhe soariam melhor e ainda se não havia inventado a cerebrina teoria de fazer de um uso geral a constante de doutos e indoutos da nossa terra, erro crasso da língua. Não refoge de todo ao neologismo pertinente nem recua ao estrangeirismo expressivo e necessário. Encontra-se-lhe por acaso uma ou outra impropriedade ou sacrifício ao uso comum. Estes senões, se é certo que o sejam, e em todo caso raros, não lhe chegam a macular a escrita ou sequer a lhe empanarem a geral formosura. Tais e maiores se nos deparam nos melhores dos chamados clássicos da língua. Esta é nele portuguesa de lei pela correção gramatical e mais pelo torneio da frase, índole, número e propriedades do vocabulário, sem indiscretas escavações arcaicas e apenas com uma ou outra afetação impertinente de classicismo. Com alumiado entendimento leu e meditou os clássicos, o que não era costume aqui, e se lhes apropriou da língua, com exata inteligência da sua evolução e fino tato de escritor de raça.

A sua obra principal, começada a publicar em 1852, é o Jornal de Timon, obra sem precedentes na nossa língua e uma das mais originais da nossa literatura. No pensamento do autor devia o Jornal de Timon ser uma espécie de revista dos «costumes do tempo» vistos através do seu temperamento, cuja austeridade lhe valia dos seus concidadãos o apodo de misantropo ou mais vulgarmente casmurro, e descritos e comentados com o seu natural humor e veia literária. Dá-se antes como «amigo contristado e abatido» do que presenciava, que como «inimigo cheio de fel e desabrimento». O «seu fim primário», porém, ficaria «sendo sempre a pintura dos costumes políticos». Mas