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com que atuava a literatura portuguesa antes do Romantismo.

A idéia da morte é uma obsessão em Álvares de Azevedo. Direta ou indiretamente, intencional ou inconscientemente, aparece ou insinua-se-lhe nos versos como a que, com a do amor, lhe é mais familiar. Lembranças de morrer, um dos seus mais belos poemas, como Se eu morresse amanhã, de igual sentimento e beleza, não são mais que manifestações explícitas da íntima angústia de sua alma de que, como verdadeiro poeta, ele fez deliciosas canções. E apenas haverá algumas das suas que a não reveja.

II. Laurindo Rabelo

Laurindo José da Silva Rabelo, fluminense ou antes carioca, viveu de 8 de junho de 1826 a 28 de setembro de 1864. Menos a educação e a cultura, que, não obstante a sua formatura em Medicina, parece não terem sido apuradas, havia nele feições de Álvares de Azevedo. Foi igualmente, talvez desde a puberdade, doente e fraco. De origem e condição humilde, mulato de raça, a consciência da sua situação, sem a força de caráter necessária para a contrastar, amargurou-lhe desde cedo a existência que levou à boêmia, obrigado da necessidade, se não também pelo natural relaxamento a angariar amizades e proteções da benevolência social, ornando e animando partidas e festas com o seu estro e as suas facécias, improvisos, glosas, poesias recitadas ou cantadas à viola, como um aedo ou trovador primitivo, e mais os ditos que se lhe atribuem. Foi, como nenhum outro, o poeta popular, mais conhecido em seu tempo pela alcunha de Poeta lagartixa, tirada de seu corpo escanifrado, que pelo seu nome. Não o roçou a descrença romântica, como a Álvares de Azevedo e a Junqueira Freire. Não lhe fugiu, ou sequer se lhe desvaneceu notavelmente a ingênua crença doméstica, conservada, como é tão comum, por hábito, e nele, poeta de nascença, por