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que o hiperbólico e o pomposo estavam na feição do tempo, ao exagero, era a cidade, desde o primeiro século da sua fundação, uma povoação adiantada, de muita comodidade e riqueza. «A Bahia é a cidade de El-Rei e a Corte do Brasil» — escrevia o padre Fernão Cardim, já em 1585. Tudo é relativo. A nós hoje a Bahia se nos afigura ainda uma cidade atrasada, de escasso conforto, comparada a outras mesmo do Brasil, como Rio de Janeiro e S. Paulo. Como quer que seja a cidade do Salvador, na sua extravagância e incoerência de todas as primitivas cidades americanas, meios aldeamentos de índios, meios acampamentos militares, meias povoações civis, aglomerações de choupanas, fortalezas, casas de moradia, residências oficiais, todas mesquinhas e feias, era a sede do Governo-Geral e assento dos seus membros, autoridades civis e militares, cujas funções aliás ainda se confundiam. Dessas autoridades o maior número eram fidalgos de condição e tratamento. Era também a sede do único bispado do país, com a sua sé e o que ela implica de cônegos e mais dignidades. Possuía já muitas igrejas, alguns conventos e um colégio dos jesuítas, cujas aulas quase todos os letrados do tempo haviam freqüentado. No seu tempo se fazia justamente ouvir a voz eloqüente e florida do padre Antônio Vieira e a sua palavra de um tão literário sabor. Tinha «muitas casas sobradadas e de pedra e cal, telhadas e forradas como as do Reino» das quais ao tempo de Gandavo, que o diz, «havia ruas muy cumpridas e formosas». No tempo daqueles poetas teria de uns mil ou mil e quinhentos moradores, e os seus arredores dois mil e quinhentos a três mil. Desde meio século antes destes poetas, havia na