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a parasita azul
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da cosinha franceza, sem a leitura do Figaro ou da Gazette des Tribunaux!

Camillo suspirava comsigo mesmo; tornava-se então ainda menos communicativo. Não se perdia nada porque o seu companheiro fallava por dois.

Acabada a refeição, accendeu Camillo um charuto e Soares um cigarro de palha. Era ja noite. A fogueira do jantar allumiava um pequeno espaço em roda; mas nem era precisa, porque a lua, começava a surgir de traz de um morro, pallida e luminosa, brincando nas folhas do arvoredo e nas aguas tranquillas do rio que serpeava alli ao pe.

Um dos tropeiros saccou a viola e começou a gargantear uma cantiga, que a qualquer outro encantaria pela rude singeleza dos versos e da toada, mas que ao filho do commendador apenas fez lembrar com tristeza as volatas da Opera. Lembrou-lhe mais; lembrou-lhe uma noite em que a bella moscovita, mollemente sentada n’um camarote dos Italianos, deixava de ouvir as ternuras do tenor, para contemplal-o de longe cheirando um raminho de violetas.

Soares atirou-se á rede e adormeceu.

O tropeiro cessou de cantar, e dentro de pouco tempo tudo era silêncio no pouso.

Camillo ficou sosinho diante da noite, que estava realmente formosa e solemne. Não faltava ao joven goyano a intelligencia do bello; e a quasi novidade d’aquelle

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