Saltar para o conteúdo

Página:Historias da meia noite.djvu/22

Wikisource, a biblioteca livre
22
historias da meia noite

de gostar nunca de outro, e assim pensam todos os mais.

— Não admira que não saiba amar, reflexionou Camillo pondo os olhos no horizonte como se estivesse alli a imagem da formosa subdita do tzar. Nem todas receberam do ceu esse dom, que é o verdadeiro distinctivo dos espiritos selectos. Algumas ha porêm, que sabem dar a vida e a alma a um ente querido, que lhe enchem o coração de profundos affectos, e d’este modo fazem jus a uma perpétua adoração. São raras, bem sei, as mulheres d’esta casta; mas existem…

Camillo terminou esta homenagem á dama dos seus pensamentos abrindo as azas a um suspiro que, se não chegou ao seu destino, não foi por culpa do auctor. O companheiro não comprehendeu a intenção do discurso, e insistiu em dizer que a formosa goyana estava longe de gostar de ninguem, e elle ainda mais longe de lh’o consentir.

O assumpto agradava aos dois comprovincianos; fallaram d’elle longamente até o approximar da tarde. Pouco depois chegaram a um — pouso, — onde deviam pernoitar.

Tirada a carga dos animaes, cuidaram os criados primeiramente do café, e depois do jantar. N’essas occasiões ainda mais pungiam ao nosso heróe as saudades de París. Que differença entre os seus jantares dos restaurants dos boulevards e aquella refeição ligeira e tosca, n’um miseravel — pouso de estrada, — sem os acepipes