Página:Historias sem data.djvu/51

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estremeci, hesitei, e, emfim, balbuciei a medo o que o padre me dictava...

Estava casado. Rufina não dispunha, é verdade, de certas qualidades brilhantes e elegantes; não seria, por exemplo, e desde logo, uma dona de salão. Tinha, porém, as qualidades caseiras, e eu não queria outras. A vida obscura bastava-me; e, com tanto que ella m'a enchesse, tudo iria bem. Mas esse era justamente o agro da empreza. Rufina (permittam-me esta figuração chromatica) não tinha a alma negra de lady Macbeth, nem a vermelha de Cleopatra, nem a azul de Julieta, nem a alva de Beatriz, mas cinzenta e apagada como a multidão dos seres humanos. Era boa por apathia, fiel sem virtude, amiga sem ternura nem eleição. Um anjo a levaria ao céu, um diabo ao inferno, sem esforço em ambos os casos, e sem que, no primeiro lhe coubesse a ella nenhuma gloria, nem o menor desdouro no segundo. Era a passividade do somnambulo. Não tinha vaidades. O pai armou-me o casamento para ter um genro doutor; ella, não; aceitou-me como aceitaria um sachristão, um magistrado, um general, um empregado publico, um alferes e não por impaciencia de casar, mas por obediencia á familia, e, até certo ponto, para fazer como as outras. Usavam-se maridos; ella queria