Página:Lendas e Narrativas - Tomo I.djvu/163

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incerteza, o despeito, o receio pintava-se nos rostos demudados de muitos.

E as vagas do oceano, que ameaçava traga-los, encapellavam-se aos pés deites: o povo, vendo os fidalgos erguidos e mudos n’um circulo, apinhava-se cada vez mais basto ao redor da alpendrada. Isto fazia crescer o temor, e o temor perturbava demais os animos para não poderem achar um expediente acertado.

Era por isso que esperava o astuto Pacheco.

“De um lado a colera do povo: do outro os mandados delrei—­disse, apertando com a mão a fronte, o velho conselheiro de Affonso ÍV.—­Resta-nos só um arbitrio.”

“Dizei, dizei!—­clamaram a um tempo todos, á excepcão do conde de Barcellos, que fitou nelle os olhos desconfiados.

“É necessário que annunciemos a nova da partida d’elrei, e que sejamos os primeiros a affeíar este procedimento: é necessário que vamos adiante da indignação dos peòes. Depois dir-lhes-hemos que, burlados como elles, nada fazemos aqui. Então apartar-nos-hemos sem susto, e sairemos da cidade como podérmos, na certeza de que não serei eu o ultimo, apesar de velho, que cruze as portas da alcaçova de Santarem.”

“Mas quem ha-de falar em nosso nome?—­perguntou Gil d’Ocem.