Página:Lendas e Narrativas - Tomo I.djvu/41

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gloria, debaixo do cutello do algoz, ou do punhal do assassino.”

Abdu-r-rahman recuára ao ouvir estas palavras: o suor começou a descer-lhe em bagas da fronte. Bem que tivesse mostrado uma firmeza fingida, sentíra apertar-se-lhe o coração desde que o fakih começára a falar. A reputação d’illuminado de que gosava Al-muulin, o caracter supersticioso do kalifa, e mais que tudo o haverem-se verificado todas as negras prophecias que n’um longo decurso de annos elle lhe fizera, tudo contribuia para atterrar o principe dos crentes. Com voz trémula replicou:

“Deus é grande e justo. Que lhe fiz eu para me condemnar no fim da vida a perpetua afflicção, a ver correr o sangue de meus filhos queridos ás mãos da deshonra ou da perfidia?”

“Deus é grande e justo,—­interrompeu o fakih.—­Acaso nunca fizeste correr injustamente o sangue? Nunca por odio brutal despedaçaste de dôr nenhum coração de pae, de irmão, de amigo?”

Al-muulin tinha carregado na palavra irmão com um accento singular. Abdu-r-rahman, possuido de mal refreiado susto, não attentou por isso.

“Posso eu acreditar uma tão estranha, direi