Página:Lendas e Narrativas - Tomo II.djvu/163

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barriga de uma das cavalgaduras, que já estava carregada, e que parecia achar mais prudente deitar-se em quanto as outras se aviavam.

O moleiro dava assim a modo d’umas lembranças de Napoleão dictando ao mesmo tempo a dous secretarios.

“Falaste, Bartholomeu!—­replicou o prior.—­Novidade, e grande! Ha quarenta annos que sou parocho desta freguezia, e é a primeira vez que tal me succede. É negocio intrincado, e quero ouvir o teu conselho, porque tens caixa para as cousas. Rapazes—­accrescentou dirigindo-se aos moços do moinho—­safa d’aqui, que tenho que dizer ao patrão em particular.”

“Rua!—­gritou o moleiro correndo com força ambas as mãos pelo colete e pelos calções, donde saíu um nevoeiro de farinha.—­Entre vossenhoria.”

O prior entrou, e foi assentar-se n’uma tripeça que estava a um canto: Bartholomeu assentou-se sobre um sacco de trigo defronte delle. Os dous velhos mediram-se com os olhos por momentos, como se cada um delles tentasse ler no rosto do outro os pensamentos que lhes vagavam na alma. A primeira idéa que occorreu ao moleiro foi a de alguma festa que o parocho pretendia fazer, e para que lhe