Página:Lendas e Narrativas - Tomo II.djvu/278

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o que succedeu, e já as embrulhadas, picuinhas, dicterios e descomposturas ad faciem ecclesiæ, de que antecedentemente dei conta, não teriam sobrevindo, com escandalo das pessoas graves e tementes a Deus. Era, como no logar competente deixei especificado, grande o tráfego no moinho á chegada do prior: duas récuas de machos a enquerir á porta; moços para dentro e moços para fóra; saccos de farinha a rolarem e a empoeirarem a atmosphera; bulha, encontrões, sapateada, arres, xós, pragas, diabos; um pandemonio, emfim, em miniatura. A chegada do prior foi tão inesperada e subita, que Bartholomeu, azoinado, não reparou nos que saíam á sua voz de commando. D’aqui o damno. Uma testemunha ficava ahi, sem que Bartholomeu désse por tal.

Esta testemunha era Gabriel. O pobre rapaz tinha andado, até á meia noite, do moinho para a fonte e da fonte para o moinho, com um macho e dous barris, a carrear agua. Depois, estirou-se a dormir atrás de uma pilha de saccos de trigo, com aquelle valente somno da primeira juventude, a que se não resiste nem n’um campo de batalha. Dormiu, dormiu, dormiu. Rompia a alva e ainda elle era pedra em poço. O grito de Bartholomeu despertou-o, na verdade; mas não teve animo de erguer-se: