Página:Lendas e Narrativas - Tomo II.djvu/324

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Nós os portuguezes pensámos então em buscar uma guarida para passarmos a noite, porque algumas pingas grossas de chuva nos annunciavam um aguaceiro imminente. Dirigimo-nos a mestre João, que nos declarou categoricamente ser impossivel dar-nos entrada na tóca miseravel, a que elle tivera a ousadia de pôr o nome de camara; e isto pela razão composta de que os tres inglezes a occupavam inteiramente, e não podiam ser d’alli expulsos, tendo pago trinta shellings por cabeça, em quanto nós pagáramos só vinte. O argumento era de uma solidez irreprehensivel. Pedimos-lhe todavia humildemente nos declarasse em que sitio nos poderiamos resguardar da agua do mar e do ceu; porque se houvessemos pretendido passar a nado de Jersey para França, escusáramos ter-lhe pago a mal-aventurada capitação d’uma libra esterlina, que nos fazia descer na escada social dez shellings, ou dez furos, abaixo dos tres inglezes.

Os selvagens têem mais que os homens civilisados a eloquencia do gesto, e o bom do normando, forçoso é confessa-lo, dava todos os indicios de verdadeiro botecudo. Tomando a postura sublime de um seekoenig, o rei do mar dos antigos sagas da Islandia, e com um—­là!—­que podia fazer ainda mui decente papel ao lado do—­qu’il mourut—­de Corneille, o