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a maior parte das vezes salpicavam a ela própria. A cortesã revelava-se a mim sem rebuços, depois que deixara cair na falda do leito o seu último véu. Não sei se estimei ou senti essa brusca transição; a franqueza me punha mais à vontade, é certo, porém desvanecia uma doce ilusão, que, por mais transparente que seja, nubla o espírito crédulo, quando procura no fundo do prazer um átomo sequer de amor.

Perguntei-lhe afinal se me permitia acompanhá-la depois do teatro.

— Esta noite não me pertence! . . .

— Não vais para casa?

— Não.

— Já sei! Estás convidada para uma ceia...

— Quem lhe disse?

— Em casa do Sá.

— Ah! Não me lembrava que ele é seu amigo! E o senhor, também vai?...

— Para ter o prazer de tua companhia.

— Ainda não estou inteiramente resolvida! murmurou com lentidão, e atalhou logo com certo estouvamento: porém não, vou! Por que deixaria de ir? Havemos de divertir-nos muito: o Sá tem gosto.

Acendeu-se nos seus olhos o fogo que já uma vez me tinha queimado as faces; só mais tarde devia ter a explicação desse olhar.

Quando tomei o meu lugar nas cadeiras, Lúcia tinha desaparecido.