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Mostrou-se d'entre as nuvens que se abriram;
E então com mais clareza e nitidez
A pôde contemplar; e, surprehendido
Ante a subita graça e esplendidez
Que em volta irradiava aquela estranha,
Mysteriosa e mystica Figura
Que seus olhos, ao vê-la, a imaginaram
Vinda de além da propria Formosura,
Lhe disse, n'uma voz que estranho mêdo
Agitára e turbára:


 «Quem és tu,
Que n'esta solidão saudosamente
Me empeces? D'onde vens? Porque decreto?
És do mundo e da vida? ou simplesmente
Ilusorio Phantasma de beleza?
D'estas sombras chimericas que pairam
Á superfície irreal da Natureza...
Alvas fórmas aéreas, fluctuantes
Do coração da Noite esparso e oculto?...»


E a penumbra sentiu-se trespassada
Pela voz de Marános que era um vulto
De som: era uma sombra que se ouvia...


E a nocturna Visão aproximando-se
Do nocturno viandante:


 «Eu sou aquela
Nuvem que teu espirito derrama
Sobre o mundo que a sente... assim a estrela
Sente, de longe, os olhos que a contemplam...

Eu sou a tua Alma aparecida;