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«Ó Virgem, minha Mãe! porque choraste
Aos pés da minha cruz! Para que foi
Que sobre mim os olhos projetaste,
Dois abysmos de treva e de aflição?!
Ainda te vejo, horror! nas duras fragas,
De dôr petrificada, e de joelhos!
Junto da cruz maldita, emquanto as nuvens
Cravavam seus relampagos vermelhos
Na minha fronte fria e moribunda!
Ainda te vejo, ó Mãe! E vejo a treva,
Qual aguia monstruosa e furibunda,
Roubar-te ao meu olhar que se extinguia!...
E ao ver-me então sósinho, face a face,
E mais a minha morte, é que eu chorei
Meu erro, meu engano e a dôr injusta,
Ó Virgem, minha Mãe, que te causei!
Mas a morte, phantasma alevantado
Dos pés da cruz á altura do meu rôsto,
Me disse em cavernoso tom maguado:
—Não chores mais, não chores! Vem comigo!—


«E lá fui com a Morte; e novamente
Surgi á luz do mundo; e só desejo
Esquecer para sempre, eternamente,
Essa tragedia horrível do Calvario!
Quero fugir do Espectro que persegue
A minha vida anímica e pagã,
Qual sombra melancolica da noite
Que fôsse nas pégadas da manhã...
Na vossa companhia, ó sempiternas
Divindades do Amôr e da Belleza,

Quero viver, sonhar, sentir em mim,