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do palacio, com a alma cheia de odio, e o coração de fel, sabendo que desde então não havia alliança possivel com a cidade, foi ter de novo com os seus fieis gauchos, e as suas estancias de que era o senhor, com a intenção de um dia entrar de novo em Buenos-Ayres, como Scylla, que elle não conhecia e de quem provavelmente nunca havia ouvido fallar, havia entrado em Roma, com a espada n’uma mão e uma tocha m outra.

Para alcançar este fim vejamos o que elle fez. Pedia ao governo que lhe concedesse um commando qualquer no exercito que ia combater os indios selvagens. O governo que o temia julgou affastal-o concedendo-lhe este favor, e deu-lhe todas as tropas de que podia dispôr, esquecendo que se enfraquecia mettendo todo o poder nas mãos de Rosas.

Este logo que se achou á frente do exercito fez uma revolução em Buenos-Ayres, fez-se chamar ao poder que não acceitou senão com grandes condições, porque tinha ás suas ordens todo o exercito, e entrou em Buenos-Ayres com a dictadura mais absoluta de que se tem conhecimento, isto é com toda la suma del poder publico — com toda a extensão do poder publico.

O governador que elle fez cair, ou antes que elle precipitou era o general João Romão Baleace, um dos homens que tinha mais trabalhado na guerra da independencia, e um dos chefes do partido federal de que Rosas se dizia o sustentaculo. Baleace era um nobre coração e a sua fidelidade á patria era proverbial. Havia acreditado em Rosas e tinha trabalhado muito para a sua elevação. Baleace foi o primeiro sacrificado por Rosas, morrendo proscripto e quando o seu cadaver repassou a fronteira, protegido pela morte, Rosas recusou á sua familia, não as honras funebres que eram devidas a um ex-governador, mas as simples ceremonias a quem todo o cidadão tem direito.

Em 1833 foi que começou o verdadeiro poder de Rosas. No seu primeiro governo, cheio de dissimulação,