Página:O Barao de Lavos (1908).djvu/22

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creança sobre um arame, cães sabios, barras fixas, um salafrario n’um cavallo em pello. O barão, por um phenomeno aliás frequente na dynamica dos sentidos, arrefeceu, acalmou; e n’uma intercadencia de bom-senso, filha d’uma reacção salutar do organismo, sentiu que se aborrecia muito soffrivelmente. Pôz-se então a mirar pela centesima vêz os escudétes das columnas que sustentavam a cupula central, e a contar as tiras de panninho, alternadamente azues e brancas, irradiantes do fecho do tecto, em cuja curvatura, sete annos antes, quando fôra da inauguração, tão ingommada e tão lisa, um ou outro rasgão indiscreto começava a pôr escarninhamente a certidão de edade.

O ultimo trabalho porém da primeira parte reaccendeu os instinctos pederastas do barão. — Familia de acrobatas. Cinco: um hercules monolithico; um rapazola magro, de ossatura agressiva; uma mulheraça toda expluente de adipos; uma creancita franzina, sem sexo, amedrontada, froixa; e um ephebo extraordinariamente elegante. — Fatos cerces de malha côr de carne, modelando escrupulosamente as formas, dando uma impressão do nu quasi flagrante, realçada nos mais leves detalhes anatomicos por bem calculados effeitos de luz Drummond.

Faziam trabalhos academicos; reproduziam as composições celebres da estatuaria classica. A rapida sucessão dos grupos, architectados em meio da arena, sobre um velho tapete, na crua incidencia da luz do magnesio, tinha uma viva arrogancia de animalidade, suggeria as demencias quentes do sensualismo pagão. A um tempo viril e dôce, impetuosa e languida, effeminada e rude, aquella mobilidade atormentada e artística insopava os nervos n’uma alta