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Página:O Barao de Lavos (1908).djvu/36

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tante d’uma forte protecção, affectuosa e discreta, que a involvesse n’uma calma tépida de estufa, para viver. Uma noite, ausentes os Noronhas em sarau do Paço, propôz-lhe o amante fugir. Acceitou. E, dias depois, a fronte de ordinario tôrva de D. João III caliginava-se, ao saber que o cortezão em desfavor, desprezando o mandado de embarque, se fôra alcandorar, com uma nobre virgem raptada, na penhascosa e abrupta solidão do seu castello de Monsanto.

Pensou em fazel-o render-se, mandando-o cercar. Difficil. Tinha o Castro leaes, valentes e numerosos servidores. Monsanto, — espessa corôa mural d’um alto mamelão lascado a pino, — era de natureza inexpugnavel. E depois, o rei na occasião preoccupava-se demasiado com a Reforma, contra a qual prorompêra, de collaboração com Carlos v, n’uma guerra implacavel, e com a deflagração sinistra dos autos de fé. Depressa esqueceu o rebelde, em cujos braços morria, após dois breves annos d’um fervoroso idyllio, a sua dedicada e dôce amante.

D’esta romanesca mancebia porejou um filho, que vinha a ser o sexto avô do nosso barão de Lavos.

O atavismo fez explodir n’este com rabida energia todos os vicios constitucionaes que bacillavam no sangue da sua raça, exaggerados n’uma confluencia de seis gerações, d’envolta com instinctos doidos de pederasta, inoculados e progressivamente aggravados na sociedade portugueza pelo modalismo ethnologico da sua formação. A inversão sexual do amor, o culto dos ephebos, a preferencia dada sobre a mulher aos bellos adolescentes, veio-nos com a colonisação grega e romana. Nos gregos a pederastia