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Página:O Barao de Lavos (1908).djvu/58

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— São precisos, já lhe tenho explicado: um marca as horas, e o outro os minutos.
— Não me entra cá... Endróminas... — E voltando à carga: — Mas que dia tão lindo!

Agora a baronesa, ainda ao seu pesar alheada da leitura, encarou numa pontinha de cólera a causa do seu desassossego e ordenou:

— Não tem que fazer lá dentro?... Não preciso de vossemecê aqui.

Um despeito rancoroso fuzilou nos olhos da megera, que resmoneou, humedecendo as ravinas dos lábios: — És como as mais!... — E saiu de olho de través e cabeça baixa, com a ponta da cuia, retesada do muito cabelo, erguida em curva sobre o ócciput, a modo de uma grande figa.

Apenas ela desapareceu, a cabecita redondinha e leve da baronesa largou a remoinhar com fúria. Ergueu um olhar interrogativo para o espaço — que dia formosíssimo!... Aquela hora o sol não entrava já no aposento, mas metalizava em lampejos de bronze as folhas negras da grande magnólia que do jardim subia, encostada a uma das sacadas, toda viçosa e nítida num azul claro e manso de lago adormecido. A baronesa, fascinada, atirou com o livro, aproximou-se da janela e olhou... A frente da casa, que deste lado virava ao sul, ficava o jardim, camarinhado de um verde tenro e diáfano, e depois, para lá do muro, estendia-se o Largo do Caldas, com o basalto ainda envernizado da névoa matutina, as trapeiras dos altos prédios espumantes de sol, e à direita, aberta no flanco onde um vidro de lampião centelhava, a Rua da Madalena, descendo ao rio em declive rápido, num alinhamento archi-