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Página:O Crime do Padre Amaro.djvu/118

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Depois a S. Joaneira erguia-se para dar o remédio à idiota ou ir palrar à cozinha. Eles ficavam sós; não falavam, mas os seus olhos tinham um longo diálogo mudo, que os ia penetrando da mesma languidez dormente. Então Amélia cantarolava baixo o Adeus ou o Descrente: Amaro acendia o seu cigarro, e escutava, bamboleando a perna.

— É tão bonito isso! dizia.

Amélia cantava mais acentuadamente, cosendo depressa; e a espaços, erguendo o busto, mirava o alinhavado ou o pesponto, passando-lhe por cima, para o assentar, a sua unha polida e larga.

Amaro achava aquelas unhas admiráveis, porque tudo que era ela ou vinha dela lhe parecia perfeito: gostava da cor dos seus vestidos, do seu andar, do modo de passar os dedos pelos cabelos, e olhava até com ternura para as saias brancas que ela punha a secar à janela do seu quarto, enfiadas numa cana. Nunca estivera assim na intimidade duma mulher. Quando percebia a porta do quarto dela entreaberta, ia resvalar para dentro olhares gulosos, como para perspectivas dum paraíso: um saiote pendurado, uma meia estendida, uma liga que ficara sobre o baú, eram como revelações da sua nudez, que lhe faziam cerrar os dentes, todo pálido. E não se saciava de a ver falar, rir, andar com as saias muito engomadas que batiam as ombreiras das portas estreitas. Ao pé dela, muito fraco, muito langoroso, não lhe lembrava que era padre; o Sacerdócio, Deus, a Sé, o Pecado ficavam embaixo, longe, via-os muito esbatidos do alto do seu enlevo, como de um monte se vêem as casas desaparecer no nevoeiro