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O domínio público no direito autoral brasileiro
– Uma Obra em Domínio Público –

Embora muitas vezes seja erroneamente reduzido à simples comparação entre leis, essa abordagem lhe é absolutamente insuficiente – mesmo que buscar uma definição (ou sua natureza) precisa seja tarefa verdadeiramente complexa.

De fato, há variadas dúvidas sobre qual a natureza do direito comparado. Seria um método ou, ao contrário, uma ciência autônoma? Ou ambas as coisas ao mesmo tempo?[1] São tão controvertidas as opiniões que Constantinesco chega a classificá-las como “discórdias insuperáveis” para, a seguir, mencionando Amari, afirmar que “[a] ciência das legislações comparadas possui tudo – livros, cátedras, jornais, popularidade – a não ser uma definição”[2].

Prossegue o autor, citando em parte Saleilles, ao afirmar que “‘o Direito comparado, como ciência auxiliar, tem como objeto o desenvolvimento progressivo do Direito nacional oferecendo um escopo positivo seja à evolução legislativa, seja às construções doutrinárias, seja às interpretações jurisprudenciais’. Método auxiliar, ciência principal independente, ciência auxiliar, o Direito comparado é tudo isso. A confusão é grande, mesmo porque sua natureza muda a cada momento”[3].

Por fim, afirma que Josserand “concebe o papel do Direito comparado igualmente de modo prático e o define através da sua função principal, que é a de revelar a orientação

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  1. CONSTANTINESCO, Leontin-Jean. Tratado de Direito Comparado – Introdução ao Direito Comparado. Rio de Janeiro: Renovar, 1998; p. 261. Independentemente da resposta, Arnoldo Wald, citando René David, aponta a vocação do jurista brasileiro para o direito comparado. Em primeiro lugar, porque – e isto segundo Camille Jauffret-Spinosi – “em razão da história de seus países, os juristas da América Latina são todos comparatistas. É essa sua riqueza e é essa também, talvez, sua fraqueza”. WALD, Arnoldo. Le droit comparé au Brésil. Revue Internationale de Droit Comparé, n.4. Paris, 1999; p. 813. Depois, porque “já faz 40 anos que René David, ao descrever a prática jurídica no Brasil e mais especificamente aquela dos juízes, concluiu: ‘com a secura dos julgamentos franceses, e com a ignorância que eles manifestam fora da doutrina, o contraste é impressionante se lemos as decisões dos juízes brasileiros. No Brasil, a doutrina, tanto estrangeira quanto nacional, parece exercer um papel principal: autores franceses, italianos, portugueses, espanhóis, argentinos são constantemente citados, comentados pelos juízes em suas decisões. Quem quer que estude uma questão de direito brasileiro deve ter em conta os autores estrangeiros e não pretender resolver tal questão considerando apenas as leis brasileiras, decisões judiciais ou autores do Brasil”. WALD, Arnoldo. Le droit comparé au Brésil. Cit.; p. 830. Em ambos os trechos, tradução livre do autor. No original, lê-se que: “[e]n raison de l’histoire de leur pays, les juristes d’Amérique Latine sont tous des comparatiste. Là est leur richesse, là a été aussi peut être leur faiblesse” (p. 813). “Il y a déjà 40 ans que René David, en décrivant la pratique juridique au Brésil et plus spécifiquement celles des juges, a conclu: ‘Avec la sécheresse des jugements français, et avec l’ignorance qu’ils manifestent extérieurment de la doctrine, le contraste est frappant si l’on lit des arrêts des juges brésiliens. Au Brésil, la doctrine, tant étrangère que nationale, paraît jouer de premier plan: auteurs français, italiens, portuguais, espagnols, argentins sont constamment cités, commentés par les juges dans leurs arrêts. Quiconque étudie une question de droit brésilien doit en tenir compte, et ne pas prétendre résoudre cette question en considérant les seules lois, décisions judiciaires, opinions des auteurs du Brésil” (p. 830). Talvez esta seja uma vocação natural do Brasil, fruto de uma cultura miscigenada, de diversas levas de migração, de uma globalização secular. O crítico literário mais importante do Brasil, Antônio Cândido, afirma que “‘estudar literatura brasileira é estudar literatura comparada’, porque a nossa produção foi sempre tão vinculada aos exemplos externos, que insensivelmente os estudiosos efetuavam as suas análises ou elaboravam os seus juízos tomando-os como critério de validade”. CANDIDO, Antônio. Recortes. Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul, 2004; p. 229.
  2. CONSTANTINESCO, Leontin-Jean. Tratado de Direito Comparado – Introdução ao Direito Comparado. Cit.; p. 263.
  3. Grifos no original. CONSTANTINESCO, Leontin-Jean. Tratado de Direito Comparado – Introdução ao Direito Comparado. Cit.; pp. 267-268.