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A justificação dada está muito menos na recompensa da criatividade do que no objetivo de estimular a produção intelectual. Assim já ocorria com o Estatuto da Rainha Ana de 1709.
É particularmente importante, aqui, a contribuição da Constituição norte-americana que se mantém até hoje. Prevê a concessão da exclusiva “to promote the progress of sci- ence and useful arts”. É o interesse público no fomento das criações e descobrimentos o que fundamenta a exclusiva assegurada.
Não casualmente, esta exclusiva é consolidada para vigorar “for limited times”. O caráter transitório do direito outorgado é apontado como elemento essencial. Isso porque, em tais sistemas jurídicos, ao contrário do que se passou com a retórica dos sistemas continentais, a liberdade de utilização por todos era vista como o objetivo normal, que somente poderia ser afastado pela intervenção de outros princípios de interesse geral, como o fomento da produção intelectual.
Qual é então esse tempo limitado? A resposta apenas poderá ser: aquele que seja justificado para que a exclusiva sirva realmente de inventivo à atividade intelectual.
 

Adicionalmente, é o mesmo autor quem observa, com relação à definição de limitações expressas ao direito de autor pela União Europeia, que “[c]om isto se criou uma fractura grave entre o sistema norte-americano e o europeu. Na América do Norte prevalece o princípio do fair use – aceitam-se práticas limitadoras, desde que conformes com esta cláusula geral. Na Europa, pelo contrário, acaba de dar-se ao direito de autor uma rigidez total. Temos assim consagrada uma orientação monopolista extrema, que despreza as finalidades sociais”[1].

É curioso observar que o sistema de copyright da common law manteve-se dentro da visão dos privilégios de impressão, não tendo sido basicamente afetado pela Revolução Francesa, o que acarretou uma certa “materialização” do direito de autor. A base desse direito era a obra copiável, e a faculdade paradigmática era a reprodução. Dessa forma, o copyright assenta principalmente na realização de cópias, de forma que a utilidade econômica da cópia passa a ser mais relevante que a criatividade da obra a ser copiada[2].

Ascensão aponta que, por outro lado, a evolução nos países do sistema romanístico se deu a partir da extrema dignidade da criação intelectual. Dessa forma, o elemento-base passou a ser a criatividade, algo que diz respeito mais ao autor do que propriamente à obra[3].

Tal distinção entre os dois sistemas era tão evidente que durante muitos anos os Estados Unidos relutaram em conferir direitos morais aos autores. Por isso, não foi senão


    norte-americana são constitucionais, tendo em vista seu crescente alargamento. A respeito do tema, ver comentários acerca do caso Eldred vs. Ashcroft, mais adiante.

  1. ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito Intelectual, Exclusivo e Liberdade. Cit.; p. 48.
  2. ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito do Autor e Desenvolvimento Tecnológico: Controvérsias e Estratégias. Revista de Direito Autoral – Ano I – Número I, agosto de 2004. Rio de Janeiro: Lumen Juris; p. 7.
  3. ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito do Autor e Desenvolvimento Tecnológico: Controvérsias e Estratégias. Cit.; p. 7.