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O INFERNO
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creaturas devassas que são máos sem repugnancia, e medram no mal como em seu nativo elemento.

Ha d'elles, porém, que se forram ao mal, contidos por sentimento ainda mais nobre que o medo da opinião. Esquivam-se, não do peccado mortal, mas do maleficio que a sociedade civil pune ou reprova: afasta-os d'isso com asco um natural sentimento, sem esforço. Educação e habitos fortaleceram esses bons instinctos. Não são perfeitos, mas são probos, sinceros, generosos, capazes de grandes sacrificios occasionalmente. Com certos deveres nunca especulam. Denotam que a si se respeitam, que a propria estima se lhes faz precisa, ainda mais que a da sociedade, facil de transviar-se. E bem que não sejam philosophos nem devotos, sentem vivamente a dignidade de seu ser. É certo que este sentir lhes seria mais delicado e firme, se abrangessem as perspectivas da vida futura, em vez de concentrar-se cá; mas é forçoso aceitar os indifferentes quaes são; e tanto entre os peores como entre os melhores, a vida futura não é movel nem empêço: é uma coisa esquecida.

IV

O grupo dos devotos
 

Será medo do inferno que impede os devotos de matar, de roubar, de se retoiçarem, como javardos, no lamaçal dos sentidos? Crer-se-ha que elles de per