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O INFERNO

salutar é uma das mais affectivas maneiras de amar.

Se o temor leva ao deserto, o amor conduz aos homens; se o temor se fecha á chave para dentro de grades, o amor quer sempre abertas as portas. Quem envia ao martyrio os missionarios é o amor; quem dá mãe a orphãos, filhas aos anciãos, irmãs aos soldados feridos, mestres aos aldeãos, amigos aos penitentes, tutores aos innocentes, guias aos transviados, é o amor. Todo bem feito n'este mundo é o amor que o faz; e este amor, que transborda da alma dos santos, em si mesmo haure sua fecundidade e bemfazeja energia.

Permittam-me uma hypothese.

Dê-se que um Concilio ecumenico se ajunta ámanhã, e declara, depois de haver invocado o Espirito Santo, que o inferno não é perpetuo, e que a palavra «eternidade», applicada ao castigo dos peccadores, significa tão sómente pena de infinita duração. Que ha de seguir-se a similhante proclamação? Imaginam que a irmã da caridade se retira logo do grabato do infermo, e se engolpha nas suas delicias mundanaes? Pensam que o benedictino, sacudindo o pó dos livros, se precipita na Bolsa? Que o joven lazarista, repatriando-se de regiões remotas, venderia o cajado e o breviario para ir ao theatro? Imaginam de boa fé que as irmãs da caridade se acabariam para logo? Se pensam isto, que idêa formam dessas bonissimas almas que os anjos e os homens admiram?