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O INFERNO
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pavorosos gritos, devemos sem escrupulo responder: Assim seja! Claro é que nenhum de nós quereria similhar-se ao vindimador sanguinolento nem ao guerreiro ebrio; ninguem ousaria assim fallar de Atila recolhido á tenda, com receio de ser ouvido; mas similhantes confrontos que envileceriam Jupiter e offenderiam o rei dos hunos, prodigalisal-os-hemos ao nosso Deus, em seu templo, attendendo a que os prophetas sabiam melhor do que nós quaes são os elogios que lhe prazem. Taes sujeitos nada diziam do seu chefe: tudo que escreviam era o espirito santo que lh'o ditava, desde os successos até ás expressões significativas d'elles. Ora ahi está por que tudo é sagrado quanto a Biblia contém, e por que tal pensamento, que n'outro livro trescalaria a impiedade, é, na Biblia, uma adoravel coisa. Ha n'isso mysterio não menos profundo que o do inferno, se tentarmos esclarecel-o; e tal mysterio, com que se quer demonstrar outro, promove discussões que o catholicismo impugnou sempre, servindo-se d'isso como arma contra os protestantes.

O catholicismo diz aos protestantes: Como sabeis que a Biblia é divina? Conhecestes Moysés? Quando Deus lhe fallou do cimo da montanha, estaveis presente? Passastes a pé enxuto o mar vermelho, ou bebestes agua da rocha de Horeb? Quem vos affirmou que aquelle homem era propheta? Que provas vedes na Biblia de que não é toda ella obra de homens? Milagres? Outros livros os contam, e vos fazem rir. Verdades? Outros livros as encerram sem que as imputeis